OS LOUCOS NÃO MORREM
Há muito nossa Pátria perde seus homens livres, derradeiros
caminhantes, translocados, alforriados dos estereótipos que engessam a vida dos
ditos “normais”. Saber que cada um deles veio para desobedecer; para escapar ao
mundo dos padrões; orbitar outros espaços, livres de cursos, horas, datas...
tudo nos assombra, nos azucrina, nos escandaliza. Desde os loucos “pelados,
pelados com as mãos nos bolsos” aos atiradores de pedra, benzedores, manhosos
de velório, “farejadores” de folia, andarilhos de estradas solitárias,
pedidores das janelas, cantadores das madrugadas e horas mortas. Ainda aqueles
que ganharam a liberdade pelos esbranquiçados campos da Caatinga, levando os
Santos em suas caixas (e qualquer um podia ser santo); outros que requisitavam
a liberdade apenas pra si e os que retinham a coragem da verdade (daí
escutá-los, pois falavam o que não conseguíamos); outros que traziam seus
vulgos mais ou menos amados e carregavam o cajado transversal nos ombros; ainda
aqueles cantadores de Reis, tomadores de café (nunca quente demais), esfomeados
acolá da farinha, trocadores de bugigangas... São outros tantos que não
conhecemos, vimos mas não descobrimos o ser que ali habitava. Todos eles,
indistintamente, talvez nos tenham incomodado por nascerem (ou se fazerem)
livres, verdadeiros, felizes, sem máscaras; caçoados por sermos normais demais para
tanta liberdade e porque possuíam em exagero a criança que perdemos com a
malícia das atribuições da vida adulta; negados porque, depois de tudo, ainda
sentíamos cobiça do “pouco” que eles tinham. A todos os loucos, vida eternal!
Sertano
Foto: (Parte de Alegoria do Triunfo de Vênus, de Agnolo Bronzino.)
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Angelo_Bronzino_003.jpg
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